Em reunião realizada em Brasília/DF, nos dias 22 e 23 de outubro de 2012, com o Departamento Nacional DST/AIDS e Hepatites Virais, o conjunto de Coordenadores estaduais DST/HIV/AIDS foi informado da resolução da Comissão Intergestora Tripartite, a propósito dos novos marcos legais do SUS, Decreto 7508/11, 7827/12, Lei 141/12, que estabelece que o financiamento das ações e serviços em saúde não poderá mais ser executado pela modalidade de incentivo por agravo, o que pode significar o fim do que preconizam a atual portaria 2313/2002 e suas portarias complementares 2314/2002, 2555/2011, 1679/2004,1071/2003, relativas as ações de controle da epidemia das DST/HIV/AIDS, e a portaria 3.271/ 2011, de qualificação das ações de vigilância e controle das Hepatites Virais.
Embora os maiores investimentos para as ações de assistência e promoção à saúde sejam custeados por outros recursos, principalmente, dos governos locais, a exemplo de medicamentos para doenças oportunistas e para as DST, atenção primária, secundária e terciária, este financiamento específico tem caráter estratégico na medida em que fornece recursos para ações de prevenção, pesquisa, incorporação de novas tecnologias, articulação com a sociedade civil e apoio a mobilização social para ações especificas, como forma de qualificar e ampliar a resposta local, regional e nacional. A Política de Incentivo portanto foi adotada para fortalecer a resposta nacional sem perder de vista as responsabilidades locais e as dinâmicas específicas da epidemia.
A Política de Incentivo tem sido particularmente importante para a organização e o fortalecimento da prevenção e da assistência dirigidas à populações mais vulneráveis, como profissionais do sexo, gays, HSH, travestis, transexuais e pessoas privadas de liberdade. Trata-se de um modelo de atuação que concretizou a premissa do movimento da reforma sanitária de ir ao encontro das necessidades de saúde da população, sem se pautar apenas na oferta de serviços. A resposta brasileira à epidemia, reconhecida por organizações internacionais como o “melhor programa de aids do mundo”, deve-se em grande parte a este modelo de atuação.
É inegável que a implantação dos Programas de DST/HIV/AIDS no país contribuiu para avanços do Sistema de Saúde como um todo, a exemplo do controle de qualidade do sangue e hemoderivados, estabelecimento de normas de biossegurança e sistemas de vigilância epidemiológica, além de conquistas no âmbito dos direitos humanos, como o nome social de travestis e transexuais, o respeito à diversidade e o aperfeiçoamento do direito previdenciário.
A política brasileira frente à epidemia, na qual a existência de financiamento específico sempre foi um diferencial para o restante do mundo, permitiu a construção de uma resposta efetiva. É importante ressaltar que a epidemia brasileira e a sul africana eram semelhantes em 1991. Enquanto o Brasil conseguiu, em grande parte, estabilizar a sua epidemia, a infecção atinge hoje mais de 20% da população adulta na África do Sul.
Os investimentos nacionais para conter a epidemia trouxeram grandes e inegáveis avanços - o que pode produzir uma falsa impressão de que a questão está resolvida. É, portanto indispensável ressaltar que permanecem ainda imensos desafios. Entre eles, destacamos os 600 casos de transmissão vertical do HIV, os 33 mil novos casos e os 9 mil óbitos por aids a cada ano, que justificam o nosso olhar temeroso frente à essa proposta de mudança do mecanismo de financiamento.
Do ponto de vista financeiro, a Política de Incentivo para DST/HIV/AIDS não implica um grande volume de recursos, mas tem se mostrado um instrumento precioso para catalisar o planejamento estratégico, as intervenções e o monitoramento das ações, em consonância com os princípios e as diretrizes do Sistema Único de Saúde, além de garantir a sustentabilidade do processo construído ao longo destes anos.
Transparência, monitoramento público online, elaboração coletiva de intervenções, por meio do planejamento estratégico que favoreceu a integralidade, envolvendo os vários setores governamentais e a Sociedade Civil, além da aprovação final dos planos anuais pelos respectivos Conselhos de Saúde, são algumas características que tem norteado a execução da Política de Incentivo no estado de São Paulo.
Diante destas considerações, a Coordenação Estadual DST/AIDS-SP, representantes das coordenações municipais e da Sociedade Civil organizada do estado de São Paulo vem manifestar sua grande preocupação com as possíveis implicações negativas dessa decisão da Tripartite, não apenas no estado de São Paulo, mas em todo o país, e solicitar que a medida seja revista, em nome da preservação da resposta brasileira à epidemia.
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